Por muito tempo, se criou um certo tipo de preconceito, um pensamento de que quem estuda vedānta, não tem relação direta com Yoga, que seria, por sua vez, uma Tradição tântrica e vice versa.
Fato é que tantra, também faz parte de uma cultura maior, a cultura védica.
O Veda, foi compilado em 4 samhitās, literalmente coleções, por um rṣi chamado Vyāsa. Elas são: Ṛk, Yajus, Sāma e Atharva.
Estes, por sua vez, foram compostos não de uma vez só, mas com o decorrer do tempo, subdividindo-se em outras três porções: brāhmaṇa, āraṇyaka e upaniṣad.
Por volta de 500 a.C., quatro samhitās, em sua maior parte, compostas em versos – Ṛg, Sāma, Yajus e Atharva – haviam se estabelecido. Estes quatro, se tornaram conhecidos como “os Vedas”. Porém, neste momento, um novo processo de pensamento emergia, em “textos” em prosa, que se chamariam brāhmaṇas.

Os brāhmaṇas são “textos” discursivos, em sânscrito, que apresentam respostas à questões sobre as origens, e a maneira adequada para se realizar os rituais contidos nas samhitās; além de esclarecer os seus significados e símbolos.
O seu objetivo era de evidenciar o Ser como algo livre das influências malignas do mundo, e evidenciar que a imortalidade poderia ser gozada em reinos celestiais.
Isto seria feito através do domínio dos mantras utilizados nos rituais. Assim acreditava-se que se conquistaria uma vida decente neste mundo e uma melhor ainda nos próximos (celestiais).
Os brāhmaṇas exploram bastante esta linguagem criptografada e repleta de símbolos; e a maior parte, hoje em dia, não é mais aceita por especialistas na linguagem (sânscrito). Porém, ainda são vistas como uma parte deste conhecimento sobre como controlar os elementais da natureza (temos que ter em vista, aqui, que os rituais eram feitos com objetivos específicos, como o pedido de condições melhores para a vida em vários aspectos).
Os rituais, oriundos das samhitās, não eram descartados, na verdade, ainda eram feitos em várias formas. Porém, neste momento, apenas o ritual, sem um processo de pensamento lógico, não era mais suficiente para dar o fruto desejado. O humano deveria conhecer um poder interno para alcançar estes frutos. Não estamos falando de um conhecimento adquirido pela mente, mas de um que não estava disponível para todos. Um conhecimento esotérico, conquistado por um profundo estudo e reflexão sobre o significado do ritual; provavelmente acompanhado por uma disciplina física e mental, uma forma de Yoga.
É na literatura dos brāhmaṇas, que primeiramente surge uma referencia sobre a crença da reencarnação.

Após esta “era” das composições chamadas de brāhmaṇas, surge um outro tipo de composição chamada Āraṇyaka (composições que devem ter sido produzidas em lugares reclusos ou florestas – āraṇyakas. Algumas coisas precisam ser compreendidas nestas composições; em primeiro lugar, o próprio nome. É dito que estas práticas contidas nas āraṇyakas, não eram para ascetas, pois discorrem sobre rituais mais secretos e perigosos, cuja prescrição era para que fossem ensinados e praticados em áreas abertas. Nestas composições, algumas práticas sexuais aparecem, como meios de conexão entre o micro e o macrocosmos. Entre o mundano e o divino.
No final das contas, se os rituais eram ou não feitos em áreas abertas, não era o mais importante. Neste momento em que estes “textos” foram compostos, alguns ascetas, conhecidos como śramanas, traziam consigo a idéia que a vida neste mundo era essencialmente penosa; e que até mesmo as alegrias e prazeres nos afastavam do nosso maior objetivo. Estas satisfações traziam uma maior identificação com o ego, o que nos traria novamente para este mundo, após a morte (reencarnação – um conceito já bastante disseminado). Para estes ascetas, o objetivo do ser humano é a liberação da identificação com o ego e de tudo que se atribui a ele; e para isso a renúncia através das disciplinas físicas e mentais (algo não muito diferente daquilo daquilo que praticam aqueles que defendem que o Tantra não tem relação com os Vedas). Estes śramanas começavam a renunciar aos rituais védicos, que para eles eram feitos apenas com objetivos bastante pessoais, e começaram a partir para locais mais reclusos para fazerem suas práticas.
Aos poucos, estes ascetas que antes compuseram as āraṇyakas, vão compor, isto que hoje é conhecido como Upaniṣad. A āraṇyakas, que antes indicava a prática de rituais em lugares abertos, agora vai se transformando através de práticas físicas e mentais, em lugares cada vez mais reclusos; e mais importante ainda, rituais internos, como profundas reflexões e meditações (upasanas como as ensinadas na Taittirīya Upaniṣad e que não são muito distantes das práticas das āraṇyakas), na tentativa de “alcançar” estas conexões, citadas nas āraṇyakas entre o micro e o macrocosmos, que antes era considerada um conhecimento esotérico e que, neste momento é visto como um conhecimento interno e já existente, que precisa ser revelado.
O que podemos perceber é uma mudança na visão e nas práticas destes yogis, ascetas. Tântricos, vedantinos, ou com qualquer outro nome que você queira rotular, todos, pertencentes à Tradição Védica.

Artigo de Bruno Jones