A espiritualidade, acaba muitas vezes confundida com a religião. É importante compreendermos que a espiritualidade não está estabelecida em uma organização. Não existe um papa; um líder a ser seguido. Não existe um deus definido a ser seguido. Na espiritualidade, 

Deus é algo subjetivo. Você tem a liberdade de escolher a forma ou nome com o qual deseja se relacionar, como a sua referência em relação ao divino (Patañjali fala sobre isto no capítulo 2 dos yogasūtras, quando fala sobre svadhyāya). Não existem dogmas e nem devem existir crenças. A espiritualidade não é praticada sob o medo de algo que fuja a lógica e não possa ser comprovado, como a idéia de paraíso e inferno. Como se existisse uma personalidade, diferente de você, em um lugar diferente do qual você está, legislando as suas ações. A espiritualidade do Veda, nos mostra que não há algo a ser conquistado e, sim, a ser reconhecido. O reconhecimento de quem Eu sou.

Eu sou, segundo o Veda, ānanda e pūrṇam. Eu sou a felicidade e a plenitude. Portanto, quando olho para a espiritualidade pelo prisma do Veda, devo compreender que não deve ser algo árduo ou penoso; como estabelecido nas religiões. Se Eu já sou toda a felicidade e plenitude, não há nada de penoso nisso. Ouvir esse ensinamento que fala sobre essa natureza, não pode ser penoso. É como ouvir um elogio a cada momento em que estou em contato com esse ensinamento.

Várias religiões afirmam que Deus não está no mesmo lugar que nós. Se procurarmos à nossa volta, não o encontraremos. Portanto, colocam Deus em um lugar distante, a partir do qual ele está nos vigiando. Ele pode ficar bravo e punir aqueles que cometem erros ( e o que são erros, afinal? Um conceito bastante subjetivo, não é?). Certamente, Deus é pura compaixão, mas ele pode nos punir. Ele é pura misericórdia, mas, precisamos buscar esta misericórdia. É totalmente compreensível quando alguém tem dificuldades para compreender isto. 

E, é por isto que escrevo. Imagine que uma pessoa comum, em uma posição de poder, também gostaria que as pessoas a adulassem por causa desta sensação de poder.

Afirmar que Deus está no paraíso e analisando a sua vida particular; aliás; a vida particular de mais de 7 bilhões de seres humanos, para que em algum momento ele venha te julgar, não faz o menor sentido.

Compreenda Deus

O universo é um arranjo inteligente, uma criação inteligente, que implica em conhecimento por parte do criador. Quando alguém cria alguma coisa, é necessário o conhecimento desta coisa. Seja um pote, uma camisa ou açúcar, é preciso saber sobre o tema, antes de produzí-lo.

Quando estendemos esta lógica para a criação do universo, poderíamos afirmar que o criador de tudo, deve ter o conhecimento de tudo. Ele deve ser onisciente. Além do conhecimento, ele deve ter a capacidade de criar. Portanto, o criador do universo a capacidade de criar tudo, ou seja, ele também deve ser onipotente.

O entendimento deste criador, sendo Īśvara, não é uma crença. Pois, Īśvara é esta inteligência expressada pelo conhecimento e a capacidade de criar. É uma forma lógica e madura de olhar para o universo. É diferente da aceitação destes preconceitos e dogmas apresentados pelos nossos antecessores.

Então, onde estaria este Deus? A religião afirma que Deus está no paraíso, e, não aqui, onde estamos. É por isto que as pessoas sempre olham para o céu e rezam. A religião decidiu que Deus não está aqui. Então, Deus, sentado no paraíso, criou o mundo. Nos primeiros seis dias, era só escuridão. Até que, no sétimo dia, Deus criou um sol para iluminar os dias. Assim nasceu o domingo, ou sunday, em inglês. O dia do sol.

Porém, como Deus fez nos outros seis dias sem o sol? Em sânscrito, o sol é chamado de dinakaraḥ; aquele que produz o dia, Sem sol, não há dia!!!

Então, quem criou o paraíso? Deus. Aonde estava Deus antes da criação do paraíso? Existe um outro lugar chamado inferno. Era lá que Deus estava antes da criação do paraíso? O paraíso é lá em cima. O inferno é lá embaixo. Tudo é separado de tudo. Até mesmo Deus é diferente de tudo?

Vamos supor que Deus estivesse antes no inferno. Mas, por que será que ele criou isto antes de criar o paraíso? Então, quem criou o inferno? A religião não terá resposta para isto. E por isso você terá que acreditar na história que ela conta; a tal da crença. “Você não deve fazer este tipo de pergunta! É uma questão de fé!”

Portanto, tudo aquilo que foge a lógica, não deveria ser levado em consideração, pois, é crença. Tudo bem, você pode escolher viver sob crenças, mas, entenda que este estilo de vida está impedindo que você pense por si mesmo. Você está engolindo idéias preconcebidas sem questionar.

Aquilo que foge à lógica, vira uma questão de crença. Aquilo que não foge, pode ser compreendido e comprovado.

Existem dois tipos de debates ou diálogos que não são construtivos e dos quais devemos ter conhecimento. O primeiro tipo, é aquele que acontece entre duas pessoas que já estão comprometidas com duas diferentes crenças. Este tipo de debate, recebe o nome em sânscrito de jalpa, e é sustentado apenas pela opinião da pessoa. Qualquer debate entre dois fanáticos entra nesta categoria. Cada um deles está convencido de que a outra pessoa está totalmente equivocada, e tenta convencer a outra da sua própria crença, embora não haja nenhum embasamento para as suas afirmações.

O outro tipo de debate que não é construtivo, chama-se vitaṇḍā, no qual uma pessoa faz uma afirmação, Mas a outra pessoa não concorda. Por que? Provavelmente por inveja ou alguma outra razão. Uma pessoa está sempre tentando provar que a outra está equivocada.

A diferença entre um questionador e uma pessoa que está apoiada em uma crença; é que o questionador tem uma mente aberta e está disposto a explorar e conhecer. Esta é uma mente, totalmente, diferente daquela de uma pessoa apoiada em crenças.

Quando deixamos de questionar, mais cedo ou mais tarde, tornamos-nos preguiçosos. Como seres humanos, somos pensadores ou, deveríamos ser pensadores. Porém, quando deixamos de questionar, a capacidade de pensar é uma das primeiras perdas. O discernimento, tão importante nesse estilo de vida de yoga, também é perdido e, deixa-nos nesse torpor; nesse estado quase vegetativo.

O ser humano parece gostar de ter um líder. De ter alguém que tome as suas decisões. Tirando, de certa forma esse peso, essa responsabilidade de cima do próprio ombro. É mais fácil ser guiado do que ser um líder. Essa era uma das preocupações de krsna em relação a decisão de Arjuna de querer fugir da batalha.

Yadi hyahaṃ na varteyaṃ jātu karmaṇyatandritaḥ

Mama vartmānuvartante manuṣyāḥ pārtha sarvaśaḥ (BG 3;23)

“Porque, então, eu não deveria agir e, não me entregar à preguiça?

Oh, Pārtha! As pessoas acabariam me imitando.” (BG 3;23)

Utsīdeyurime lokā na kuryāṃ karma cedaham

Saṅkarasya ca kartā syāmupahanyāmimāḥ prajāḥ (BG 3;24)

“Se eu não agir, essas pessoas morrerão. Eu seria aquele que estabeleceu a confusão (em relação ao dharma) na sociedade e, portanto, tudo seria destruído.” (BG 3;24)

Essa destruição aponta para o fato de que se todos abrirem mão de seus papéis (dharma), a sociedade não se sustentaria.

Arjuna era um líder; um exemplo a ser seguido (śreṣṭha). Portanto, a decisão que ele tomasse, influenciaria muitas e muitas pessoas.

É necessário respeitar a fé e crenças de cada um. Este não é o ponto aqui. Mas, não é possível haver um debate sustentado por especulações e achismos. Isto é jalpa; um debate inútil.

Por isto é inconcebível para a lógica, afirmar que Deus criou o paraíso e depois o inferno, e todo o universo. Mas, onde estava ele antes disto tudo? Ele não estava em lugar algum? Como não questionar estas coisas?

Dentro da visão do Veda, para algo ser criado, é necessário um criador. Mas, a visão estabelecida aqui, é que não são elementos separados. Um não limita o outro. A natureza de um, não é diferente da natureza do outro. Assim como a onda não é diferente da água.

A criação e o criador não são diferentes 

Este questionamento sobre onde está Deus, surge da conclusão equivocada de que ele não está aqui.

Quando investigamos a causa da criação, nos damos conta deve haver duas causas para qualquer criação: o criador e o material. O criador é o responsável pela criação. Deve haver algum material, a partir do qual alguma coisa possa ser criada. Para a criação de um pote, deve haver um ceramista e a argila. Para fazer pão, um padeiro e a farinha.

Quando falamos de um “criador” devemos analisar tudo isto de maneira completa; e não apenas parcialmente, deixando espaços para crenças e especulações. Pois cada um pode dizer o que quiser, e não chegaremos à conclusão alguma.

Vamos usar o exemplo da Mundaka Upaniṣad. Ela diz que a aranha é a criadora da sua teia. “Yathā ūrṇanābhiḥ sṛjate gṛhṇate ca…”

Aonde a aranha encontra o material para fabricar a sua teia? No seu próprio corpo, em uma glândula. A secreção, expelida por um tubo, torna-se o fio.

Outro exemplo é o sonho. No sonho, a mente cria o seu próprio mundo. O sonho só existe depois que você dorme. Existe um corpo, uma mente e um mundo inteiro lá. Tudo é criado a partir de você. De que material é criado o sonho? O material existe na sua mente, na forma das memórias. Você é o criador do sonho e o próprio ator no sonho.

E o que existia antes do sonho? Não é possível dizer que nada existia. Eu, a consciência, testemunhei a ausência dos objetos. Eu existia no sono profundo, antes do sonho. Do sono profundo, a mente foi para este estado do sonho, no qual a memória está presente. Mas, antes do sonho, não havia o espaço, o tempo, ou qualquer nome, forma, condição ou situação. Eu testemunho esta ausência, que não é vazio, porque Eu, nunca deixo de existir. Portanto, Eu existo, mesmo antes da criação. Neste sentido, Deus é o criador e a criação. Esta é a visão de Vedānta sobre o Deus. Algo lógico; não uma crença.

Por isto, nesta visão de vedānta, que difere até mesmo da primeira porção do Veda e, da visão do yoga, Deus não é algo separado ou diferente de você. Tudo aquilo que é material, é divino também. Essas divisões estão, apenas, na mente. O dualismo existe, apenas, na mente. Você é tudo aquilo que existe, ou, tudo aquilo que existe é você. Tat tvam asi.

Bhoktāraṃ yajñatapasāṃ sarvalokamaheśvaram

Suhṛdaṃ sarvabhūtānāṃ jñātvā māṃ śāntimṛcchati (BG 5;29)

Conhecendo a mim como o sustentador de todas as ações e disciplinas; presente em tudo o que existe e, aquele que dá o resultado das ações; essa pessoa se liberta.

Podemos usar o espaço como exemplo para falar sobre a natureza de ātmā.

O espaço é livre de associações. O espaço é aquilo que permeia todos os objetos.

Porém, o espaço é limitado pelo tempo e, contido na consciência.

Não existe o espaço do pote e o espaço fora dele. O espaço é apenas um; embora possa parecer vários, pois há o espaço do pote que pode ser ocupado pela água. Essa água denuncia que, ali, existe espaço; ou seja, essa água pode refletir, confirmar a existência do espaço.

O espaço com água, ou, sem água, continua sendo espaço. 

Espaço de água ou espaço sem água é uma upādhi, ou seja, mithyā; uma qualidade que parece estar sendo dada ao espaço.

Mithyā pode representar o antaḥkaraṇa, aqui. Quando o ego é colocado de lado, ātmā é evidenciado. Quando a água é eliminada, o espaço pode ser claramente visto.

Então, o espaço com água ou sem água é o mesmo. Assim como o indivíduo, embora pareça ser diferente de tudo o que existe, por possuir determinadas qualidades, não é diferente do ātmā

Na visão do saṅkhya, que é a visão do yoga, ātmā são vários. Para cada indivíduo existe um ātmā.

Para eles o mundo relativo é real. Portanto, os objetos e suas condições seriam permanentes. Como mokṣa seria possível se as condições do universo são definitivas? Se eu sou, definitivamente, limitado por essas condições, mokṣa não seria possível.

Para a visão do yoga paramātmā é diferente de ātmā. paramātmā é um e os ātmās são vários.

Isso fica evidente nos yogasūtras de Patañjali:

“Kleśakarmavipākaśayairaparāmṛṣṭaḥ puruṣaviśeṣa īśvaraḥ”  (1; 24)

Īśvara é um ser diferente (do indivíduo), totalmente livre de sofrimento, de ação, de resultado de ação e de um reservatório de impressões do passado”

Para que o universo se manifeste, é necessário uma interação dos guṇas; que, segundo essa visão é a essência de todo o universo.

Uma idéia simples de ser refutada se lembrarmos do sono profundo. O estado da mente, no qual todos os objetos desaparecem, mas, Eu presencio a ausência desses objetos.

Portanto, mesmo que as guṇas desapareçam; Eu jamais desapareço.

Se estas afirmações fossem descartadas, haveria a mesma visão que vedānta.

Se vedānta e saṅkhya entendem que puruṣa ou ātmās não podem se associar a qualquer tipo de objeto, ambos entendem que isso é mokṣa. Mesmo que vedānta não fale sobre vários ātmās, mas aceitamos, aqui, a ideia de que o ātmā é livre, para estabelecer algo em comum.

Isso é essencial, as diferenças deveriam ser deixadas de lado e focarmos naquilo que é comum, pois esta é a questão fundamental: mokṣa.

Enquanto o universo for encarado como real. Enquanto Īśvara for encarado como diferente de brahman, eles nunca poderão ser considerados como livres de limitação, pois um limita o outro pelas suas qualidades.

Seria como admitir que a onda e o oceano são “coisas” separadas. Como existiria onda sem água?

Saṅkhya olha para puruṣa e prakṛti seguindo de forma separada e paralelamente. O criador (consciência), separado da criação (tempo e espaço).

O ponto é que o tempo e o espaço existem na consciência. Não existem separados dela. 

Tempo e espaço não são absolutos; enquanto a consciência é.

“Idam agre āsīt” (Chāndogya Upaniṣad; 6-2-1); significa: isto estava lá no começo. Mas o contexto da palavra agre, aqui, não significa tempo; mas, a não existência do tempo. Brahman é isso. O absoluto; livre do tempo e do espaço.

“O tempo não é uma realidade, mas um conceito ou uma medida”; diria, o orador grego, Antifonte

Portanto, prakṛti não está separado de puruṣa. Não é diferente de Īśvara. Assim como a onda não está separada da água.

Essa é a visão apresentada na Bhagavad Gītā, através de palavras diferentes. Isso que Patañjali chama, aqui, de Puruṣa, na Gītā é chamado de svarūpa-prakṛti. Essa palavra, prakṛti, significa “aquilo que possui a capacidade de criar”; ou karaṇa, a causa. Ou seja, é a causa de tudo. Sem ela, nada existiria. É o Ser.

Essa prakṛti pode ser chamada de cit; existência, como vemos na expressão sat-cit-ānanda. Cit é a existência, que é inegável (sat), que é livre de limitações (ānanda). Portanto, essa prakṛti sou Eu, o ātmā.

A Gītā, também nos apresenta um desdobramento dessa prakṛti; chamada de svabhāva-prakṛti. Ela é o efeito; kārya. É a manifestação dos cinco elementos básicos que constituem o universo manifestado; e o processo de criação e desenvolvimento desses elementos, dos sentidos e da mente, resultando no indivíduo.

Bhūmirāpo’nalo vāyuḥ khaṃ mano buddhireva ca 

Ahaṅkāra itīyaṃ me bhinnā prakṛtiraṣṭadhā (BG 7;4)

Terra, água, fogo, ar, espaço, mente, intelecto e, a noção de ator; constituem a minha (de Kṛṣṇa) prakṛti e, é dividida em oito partes.

O indivíduo é svabhāva-prakṛti; pois ele é o resultado de todos esses elementos juntos. Aqui, chegamos nesse conceito de māyā ou mithyā; que deve ser bem compreendido como um resultado. Como algo que surge nesse eixo tempo-espaço. Mas, que de forma alguma, é uma projeção, como muitos acreditam ser. O indivíduo não é uma ilusão. Ele possui essa realidade relativa, sujeita ao tempo-espaço; diferente do que vimos acima, em relação ao conceito de sat, que é aquilo que é sempre existente e, independe de qualquer coisa, pois, não é um resultado.

Esse indivíduo é uma upādhi, ou seja, uma sobreposição. O indivíduo está sobreposto no ātmā; no sentido de que ele existe, apenas, porque o ātmā existe.

Portanto o ātmā, que é brahman, é a essência para a manifestação de todos os nomes e formas; assim como o barro é a essência para a manifestação de todos os objetos feitos de barro.

Esse desdobramento de todos esses elementos, para demonstrar como o universo se manifesta é uma técnica de ensino, que recebe o nome de Prakriyā; que é uma argumentação para embasar a explicação, que está sendo dada. Aqui, no caso, é chamada de srsti-prakriyā; ou seja, uma argumentação sobre a criação. Tal argumentação aparecerá Chāndogya Upaniṣad, quando o sábio Uddālaka, conta ao filho, Śvetaketu, que antes da criação do universo, existia apenas um. Isso que existia, era sat; essa existência, inegável, descrita nos parágrafos anteriores, que é advitīya; não limitada por outro e, livre de outras partes. Pūrṇam, como vemos no mantra de paz.

Então, Uddālaka ensina sobre a criação do universo e seus elementos, a partir dessa existência; inegável. Ele menciona, apenas, três elementos e, isso é interessante para que não fiquemos presos à uma fórmula engessada sobre a criação do universo; pois, no fim das contas, a sua essência é ānanda, ou seja, livre de limitações. Portanto, o foco não está em quantos elementos existem; mas, naquilo que sempre existe.

Para Uddālaka, existem três elementos: terra, água e fogo. Portanto o ātmā, que é brahman, é a essência para a manifestação desses elementos; assim como o barro é a essência para a manifestação de todos os objetos feitos de barro.

Essa é a explicação para a dúvida que pode surgir acerca do tema de brahman não se manifestar. Se ele não se manifesta; se ele não está sujeito à mudanças, como todos os nomes e formas surgem? Da mesma maneira que todos os objetos feitos de barro surgem, sem que o barro tenha se transformado em outra coisa. E, quando esses nomes e formas de barro deixarem de existir, continuarão sendo barro.

Etadyonīni bhūtāni sarvāṇītyupadhāraya

Ahaṃ kṛtsnasya jagataḥ prabhavaḥ pralayastathā (BG 7;6)

Compreenda que todos os seres e elementos têm a sua causa nessas duas parkṛtis. Eu sou aquele, a partir do qual todo o mundo existe e, em quem tudo se dissolverá um dia.

Yato vā imāni bhūtāni jāyante yena jātāni jīvanti yatprayantyabhisaṃviśanti (Taittirīya Upaniṣad 3;1)

Busque compreender que brahman é aquilo, a partir do qual todos surgem; através do qual, todos se sustentam e, para o qual todos retornam.

Então ele diz para o seu filho: isso que é inegável é o ātmā. Todo o resto é criado a partir dele. O corpo é criado, a mente e os sentidos. Aquilo que nunca foi criado; ou seja, sempre existiu, é o ātmā. Lembremos, mais uma vez, do mantra de paz. Aquilo que existia antes da criação; ainda existe, da mesma forma, depois da criação. É invariável. Portanto, Śvetaketu, tat tvam asi.

Portanto o vedantin tem a autoridade para dizer que ātmā é livre de limitação; não o saṅkhyin

O que vedānta quer mostrar é que toda relação com o universo é relativa, não é real; enquanto saṅkhya afirma que esta relação é real. Se aceitarmos esta premissa, mokṣa não é possível 

Mesmo que este ilimitado, consciência, inteligência, ou Deus, não possa ser conhecido através dos sentidos, ou concebido pela mente, é aquilo que existe, que não pode ser negado, que tudo sustenta.

Este papo de justiça divina não existe para quem tem a compreensão de Īśvara, que é esta inteligência que rege todo o universo. Não existe bom ou ruim. O que existe é aquilo que deve existir. E cada um de nós terá que passar por um determinado número de experiencias, agradáveis, ou não, neste processo de amadurecimento.

Mesmo que não amadureçamos o suficiente para enxergarmos esta realidade livre de limitações; isto não te torna limitado. Você sempre será livre de limitações, reconheça ou não. Por isto, não existe outro lugar para ir, como paraíso ou inferno; pois, um estaria limitando o outro. O universo, seria diferente de você.

Justiça é um conceito da mente humana. Justiça é algo completamente relativo. Quando digo isto, sugiro que você olhe para a natureza e me diga o que é justo? Os mais fortes se alimentam dos mais fracos. Seja o animal ou até mesmo a planta. Você acha que uma floresta é pura harmonia? Claro que não! É uma árvore “querendo” ser mais alta do que a outra para poder pegar mais luz do sol.

Um animal ou planta não têm senso de justiça. Isso só acontece nos desenhos da Disney! Você vê o Rei Leão ou a mãe do Bambi morrerem e acha tudo aquilo injusto. Você pode achar isto. Até mesmo o animalzinho, do desenho animado, pode achar isto; mas, na natureza não há injustiça. Há o sentimento de tristeza no animal. Isso é inegável. Mas, não, o senso de justiça.